Vinagrete 17.12.19 – Quadrado politicamente incorrecto

Os críticos até dão uma boa classificação ao filme O Quadrado, do realizador sueco Ruben Östlund, com os actores Claes Bang, Elisabeth Moss, Dominic West, Christopher Læssø, e apresentado como uma Comédia Dramática. Na verdade, uma comédia bastante negra, a recordar nesse sentido quase o Nova Iorque Fora de Horas, de Scorsese (1985).

Realizador de ‘O Quadrado’ muito premiado em Berlim, fotografia de 24.sapo.pt

Este filme O Quadrado teve o mérito de ocupar agora pelo menos 3 grandes cinemas de Lisboa: o Munumental, UCI – Corte Inglês e NOS – Amoreiras – fora outros que não vem agora a propósito referir aqui, mas o que dá ideia do grande público que teve.

Dei comigo a pensar que ninguém o percebeu bem. Primeiro, porque as pessoas que foram ver o filme, certamente espevitadas pelos críticos, não reagiam (nem riam) nas suas partes mais divertidas; depois, porque um dos críticos mais entusiastas, numa entrevista que fez ao realizador, deixou passar em branco algumas das ‘mensagens’ que ele pretendeu enviar, com riso ou sorriso, através do filme. Já vi que outros acabaram por o perceber, muito contrariados (mas sem deixarem ainda assim, talvez envergonhados pelas outras boas classificações, nomeadamente internacionais, pelo menos 2 estrelas).

Baseia-se ele num curador de um grande museu, pessoa muito politicamente correcta (guia um carro eléctrico, adora as filhas que lhe ficaram de um casamento terminado, educa-as muito modernamente, quer moderar a perseguição a uns pobretanas que o assaltou, e pretende esticar ao máximo as ‘bizarrias’ da rate no seu museu). A história baseia-se muito numa instalação, “O Quadrado”, bastante peculiar, que convida os visitantes a reflectir sobre altruísmo. Mas claro que o artista (no caso uma artista), usa palavras e intenções tão banais (se fosse cá, seriam todas expressas em inglês, e lá penso que também, para procurar uma internacionalização que a pouca ou nenhuma criatividade não conseguiria, apesar de politicamente bastante correctas). E, para ajudar o curador na promoção do evento, ele conta com o departamento de relações públicas do museu, e a maior criatividade (até por necessidade de ’espicaçar’ os jornais) de uns funcionários de uma empresa de ralações públicas, que consegue fazer um vídeo ‘viral’ nas redes sociais, com uma mensagem oposta à da actriz, mas sobre o seu trabalho (que sendo politicamente incorrecta, levará o curador à sua consensual, incluindo o consenso dele próprio, demissão).

Pelo meio, numa entrevista a uma jornalista americana, explicando a sua intenção de ‘esticar’ os limites da arte, ele sugere que a carteira dela, posta numa sala do museu, passaria a obra de arte. E reconstrói uma instalação ‘escangalhada’ pelos serviços de limpeza, tirando apenas o ‘cascalho’ do lixo, e voltando a colocá-lo ele onde pertence. Enfim, tudo coisas muito politicamente incorrectas, mas divertidíssimas. Até surpreende que tenha ganho a Palma de Ouro na 70.ª edição do Festival de Cannes. Porque fica a sensação de que os nossos críticos o qualificam bem, por o não terem percebido.

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